Em tempos de crise econômica, o recorde de inadimplência das empresas e dos consumidores não tiram o sono de Marcelle Zequini, sócia da Casa do Médico, comércio especializado na locação e venda de equipamentos médico-hospitalares.
Com um faturamento médio de R$ 6 milhões por ano, os negócios funcionam com um invejável nível de inadimplência, que oscila entre baixíssimos 0,5% e 1,1%. Dados da recente Pesquisa de Perspectiva da Serasa Experian mostram que a inadimplência das empresas já está em nível acima do padrão, com taxa de atrasos na ordem de 3,5%.
A empresa está na ativa há quase 40 anos, e de lá para cá já se foram muitas crises. Marcelle garante que o índice de clientes que não honram os pagamentos não muda, em tempos bons ou ruins. Para ter essa tranquilidade, a sócia adota um simples cuidado: a gestão atenta da sua carteira de clientes.
Fazem parte da rotina da Casa do Médico medidas simples, como consulta aos órgãos de proteção e análise de histórico financeiro. Quando surgem problemas, fica mais fácil negociar direto com o cliente, prorrogar prazos ou parcelar vendas em aberto.
“Tentamos ao máximo não deixar o problema ir para a frente”, diz a empresária que pretende transformar seu negócio em franquias, e abrir quatro novas lojas até o final de 2016. Hoje, a empresa tem quatro unidades em funcionamento.
Não receber em dia afeta companhias de todos os portes e o problema é maior em ano de economia instável. Para as PMEs, a questão é ainda mais dramática, devido ao caixa enxuto e ao pequeno número de clientes.
Quando o inadimplente é um cliente-chave na carteira, é quase uma tragédia anunciada. “Fica um buraco no fluxo de caixa”, diz Ana Vecchi, diretora da Vecchi Ancona Consultoria Estratégica.
A maior parte dos pequenos negócios comete dois erros clássicos. O primeiro deles é não fazer nenhum trabalho preventivo, e só correr atrás do mau pagador depois que o incêndio já aconteceu.
Já o segundo é partir para o tudo ou nada, cortando relações com o cliente, ao invés de tentar um novo relacionamento. Nenhuma das duas, segundo Ana, ajuda a formar uma carteira de qualidade e bem administrada e que gere taxas de inadimplência consistentemente baixas.
“Uma boa política de concessão de crédito parte de um conceito-chave: não olhar os clientes como se fossem iguais. Em função da concorrência, é preciso criar um relacionamento próximo da realidade para impactar de forma positiva no processo de cobrança.”
Conheça as orientações da consultora para evitar a inadimplência e manter a carteira de clientes eficiente.
ENCONTRE OS BONS PAGADORES
É básico verificar se a empresa com a qual está prestes a fechar uma venda tem títulos protestados ou cheques devolvidos. Mais inteligente é prospectar clientes entre aqueles que já estão com a ficha limpa. Claro que, em tempos de mercado recessivo, o método pode restringir as oportunidades. “Levantar dados é prevenir desgaste, quebra de relacionamento e, por fim, calote. A falta de organização nesse sentido atrai os maus pagadores”, afirma Ana.
A FICHA LIMPA NÃO É TUDO
A simples consulta aos serviços de proteção ao crédito fornece um retrato do momento, e diz pouco sobre o perfil da empresa. O contrário também é verdade: um único cheque problemático não deve ser suficiente para condená-la.
É possível saber a diferença entre o cliente quem tem o mau hábito de não honrar seus compromissos e o que está em dificuldades transitórias em caixa. “Busque o histórico financeiro de cada um nas empresas especializadas como o SCPC, da Boa Vista Serviços, ou Serasa”, recomenda.
OLHE ALÉM DOS NÚMEROS
No caso das pequenas empresas ou dos negócios com pouco tempo de mercado, é um pouco mais difícil analisar o histórico de crédito. A alternativa é fazer uma avaliação com base em outras informações, como o perfil dos sócios. Assim, segundo a consultora, é possível descobrir se eles já tiveram outros negócios – e qual foi o comportamento dessas empresas em relação aos credores.
UM PLANO PARA CADA UM
Reduzir a inadimplência não significa banir de vez empresas com problemas. Para diminuir os riscos, o ideal é separá-las entre os clientes que têm a ficha limpa e aqueles que valem um sinal amarelo. Com a divisão, os bons clientes podem ser beneficiados com descontos, prazos maiores de crédito ou negociação mais flexível, em caso de uma inadimplência pontual. “Já no grupo do sinal amarelo, o ideal é reduzir o tamanho dos pedidos”, alerta Ana.
CUIDADO COM GRANDES ENCOMENDAS
Em empresas que fazem vendas de valores baixos para muitos clientes, a opção mais comum é assumir o risco de não receber – e torcer para que isso não aconteça. Mas se a encomenda for maior, é preciso parar para pensar para que um eventual calote não cause tantos transtornos. Em certos casos, é melhor fracionar a venda. “Ou trocar o pagamento a prazo por um bom desconto à vista, com entrega mediante comprovação”, afirma.
SIGA OS PASSOS DOS CLIENTES
Boa parte dos inadimplentes costuma estar entre os clientes antigos, e não entre os recém-conquistados. Eles precisam ser monitorados constantemente, e separados por graus de risco.
Conforme o risco aumenta, o acompanhamento deve ser mais frequente. Até uma mudança de sócio requer nova análise, e informações novas devem impactar políticas de concessão de crédito.
“Por serem antigos, há clientes que acreditam que podem relaxar com os pagamentos, por terem mais flexibilidade”, diz. “Por isso, é preciso saber qual é o que gosta de levar vantagem, e avaliar se vale a pena manter essa relação. E isso vale tanto para pessoa física como jurídica.”
Fonte: Diário do Comércio