Há muito os empresários lutam contra a carga tributária no país, não importando os mecanismos criados pelo governo para simplificar ou reduzir a tributação, pois, paralelo à simplificação, os estados e municípios criam outros mecanismos para não perderem ou reduzirem sua arrecadação. O clássico exemplo são as empresas enquadradas no Simples Nacional, o qual é um regime tributário simplificado para o recolhimento de tributos de micro e pequenas empresas, pois unifica os impostos (federais, estaduais e municipais). Ocorre que os entes federativos, por meio de manobras, estão realizando na cobrança o diferencial de alíquota do ICMS (Imposto de Fronteira) das empresas enquadradas no Simples Nacional e isso tem deixado o setor empresarial preocupado, pois se acreditava que o enquadramento no Simples Nacional traria benefícios e segurança fiscal, o que não ocorreu.
A inconstitucionalidade acontece porque os estados editam decretos, os quais não podem legislar sobre matéria tributária, logo, não podem exigir o pagamento antecipado da diferença resultante entre as alíquotas interestadual e interna por meio de decreto, pois não podem realizar alteração do aspecto temporal da hipótese de incidência tributária. Ao analisar o art. 155, § 2º, inciso II, da Constituição Federal, podemos observar que o fato gerador possível do ICMS como sendo as operações relativas à circulação de mercadorias, sendo que a não cumulatividade, constitucionalmente estabelecida, é a sistemática do imposto. Logo, essa regra constitucional que disciplina o fato gerador e a não cumulatividade do tributo determina que o débito só será feito por ocasião da saída da mercadoria e só após é que haverá o pagamento do imposto no prazo estabelecido pela legislação.
Simplificando a sistemática constitucional do tributo, o pagamento do imposto somente pode ser determinado após a operação de saída (fato gerador) e depois de abatido do imposto incidente na aludida saída, o imposto incidente na entrada da mercadoria (não-cumulatividade). O estado jamais pode antecipar parcialmente o fato gerador – e muito menos por simples decreto – para então considerar devido parcialmente o imposto e, a partir disso, antecipar o prazo de pagamento. A pretensão do estado não está autorizada pela Constituição Federal vigente. Apenas em uma circunstância a Carta Política autoriza a cobrança do imposto antes da ocorrência do fato gerador, e apenas em uma outra, autoriza a cobrança de diferença de alíquota mesmo não havendo um fato gerador posterior à operação interestadual.
Nas operações praticadas pelas microempresas ou empresas de pequeno porte optantes do Simples Nacional, a situação é mais delicada, pois é vedada a apropriação de quaisquer créditos. Deste modo, o imposto estadual recolhido pelo ingresso da mercadoria no estado não é restituível pelo creditamento e soma-se ao ICMS recolhido sobre a receita bruta das microempresas ou empresas de pequeno porte, em clara e flagrante bitributação, em desarrazoado aumento de carga tributária e em absoluta desconsideração da garantia ao tratamento beneficiado, concedida pela Constituição Federal, tanto em seu art. 146, inciso III, letra “d”, quanto em seu artigo 170, inciso IX.
Felizmente, os Tribunais de Justiças têm julgado improcedente a cobrança desse diferencial de alíquota de ICMS em face de sua inviabilidade por não gozar da melhor técnica, sem mencionar que esta questão teve sua repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), estando pendente de apreciação naquela Corte. Mas em caso semelhante, o STF, já julgou inconstitucional, conforme in verbis: “Tem densa plausibilidade o juízo de inconstitucionalidade de norma criada unilateralmente por ente federado que estabeleça tributação diferenciada de bens provenientes de outros estados da Federação”.
Assim, tal cobrança para as empresas do Simples Nacional é nada mais do que a cobrança de um ICMS por compra de mercadoria, sem qualquer previsão na Constituição Federal outorgando a competência para que os estados instituíssem este imposto. Se fosse antecipação de pagamento, como autoriza a Legislação do ICMS do nosso Estado, se deveria apurar segundo as alíquotas do Simples Nacional e excluir esses pagamentos da base de cálculo do pagamento posterior, o que não ocorre. Isso é um abuso do Poder Executivo na cobrança ilegal dessa Antecipação das empresas do Simples Nacional, já rechaçada pelo Poder Judiciário. Existe mecanismo jurídico para a recuperação desses valores pagos indevidamente ao Fisco Estadual, pois se trata de um direito ter restituído aquilo que se pagou a mais.
Por Harrison Nagel
Fonte: Monitor Digital