Ministério Público e Sebrae alertam empreendedores sobre cobranças indevidas

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RIO — Julianna Sá estava na boca do caixa pagando uma pilha de contas. Uma delas era referente à sua recém-criada empresa de promoção de eventos. Um sonho realizado havia quatro dias, e tudo o que o envolvia precisava ser resolvido logo. Era um boleto de R$ 297,80 da Associação Comercial Empresarial do Brasil (Aceb). O nome não deixava dúvidas, para ela, de que se tratava de algo oficial, mas a empresária estranhou — ela era microempreendedora individual, o que lhe dava a grande vantagem de um pagamento único mensal de R$ 41,20. Antes de entregar a última conta para o caixa, ligou para um amigo para pedir orientação:
— Ele mandou eu parar o que estava fazendo, dizendo que era armadilha. O pagamento não se referia às minhas obrigações como empresária.

Empresária pagou por engano

Segundo a gerente adjunta de políticas públicas do Sebrae, Inês Schwingel, há associações que realizam cobranças indevidas de procedimentos que são gratuitos, como a formalização.
— Várias entidades foram constituídas com objetivo de falsear a representação das micro e pequenas empresas, enviando boletos bancários fraudulentos a empresários de todo o país.
Flávia Couto, dona da marca de acessórios femininos Fundição Filomena, não teve a mesma sorte de Julianna. Apesar de ter um contador contratado, Flávia não recorreu a ele quando recebeu a mesma guia da Aceb e pagou no banco.
— Paguei porque o documento fazia referências à Constituição e parecia ser um imposto obrigatório. Depois descobri que era facultativo e que a opção constava no boleto, mas a formatação dele me induziu ao erro — conta Flávia que, hoje, costuma alertar seus franqueados e encaminhá-los ao contador.
O advogado especializado em direito empresarial Philippe de Lazaro explica que a Constituição trata do direito de associação como algo que depende da vontade do interessado:
— É ilegal toda cobrança que tente coagir o empresário, sem que ele tenha manifestado interesse em se associar ou pagar pelo serviço.
A proliferação dessa prática, sem consentimento de quem recebe os boletos, levou o Sebrae e a Secretaria da Micro e Pequena Empresa a procurarem o Ministério Público Federal.
— No fim de 2013, enviei ofício a 11 associações indicadas pelo Sebrae. Nele, pedimos esclarecimentos a elas — explica Antonio Fonseca, subprocurador-geral da República e coordenador da Câmara do Consumidor do MPF.
A maioria dos ofícios nem chegou às associações porque não é possível identificar o endereço correto das mesmas, o que indica que possivelmente sejam fraudulentas, diz Fonseca. Só duas entidades responderam. Uma delas é a Aceb.
— Ainda assim, as respostas são incompletas e constatamos que as associações enviam a guia de pagamento sem o consentimento dos empresários e, portanto, sem obedecer os critérios que o Banco Central estabelece.

Boleto deve seguir padrão do BC

De acordo com o BC, há dois tipos de boletos: os de cobranças (quando já existe uma dívida a ser paga) e os de proposta. Nesse caso, eles devem ser emitidos a partir do interesse prévio do destinatário, que tem o direito de obter, antes de pagar, as informações relacionadas ao serviço ofertado , além do contrato que disciplina direitos e obrigações do pagador e do prestador.
Flávia Couto diz que nem antes nem depois de ter pago à Aceb recebeu informações detalhadas sobre os benefícios que teria como associada tampouco contrato de prestação de serviços. A Aceb se defende, dizendo que, para cortar custos de impressão e evitar extravios, resume os serviços na guia e procura encaminhar o empresário a seu site, onde eles estão detalhados.
— Não praticamos golpe, nem fraudes. O pagamento de nossos serviços é facultativo, e a opção consta no boleto. Temos cerca de 4,2 mil associados em todo o país, a quem prestamos consultorias jurídica, contábil e financeira — explica Frabrizio Quirino, gerente de comunicação da Aceb.
E, se ao abrir um negócio, o empresário passa a ser assediado por boletos indesejados, ao pedir registro de marca, também. Fernando Montera recebeu um boleto de R$ 255,50 da Associação Nacional de Propriedade Industrial e Intelectual (ANPII), assim que entrou com a solicitação de registro da marca eCommet no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI):
— Era uma proposta de serviço, mas parecia praxe dos trâmites do processo. Não paguei porque fui bem orientado.
O diretor da ANPII Cristian Renato Dias respondeu que a associação encaminha carta proposta de assessoria durante o processo de registro e deixa o cliente livre para optar pelo serviço, ao indicar que o pagamento é facultativo.

Fonte: O Globo

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